Estudo dos efeitos toxicológicos decorrentes da libertação de chumbo a partir de artes de pesca

Abstract

A poluição ambiental é um dos maiores desafios atualmente enfrentados pela sociedade. Entre os contaminantes ambientais mais comuns, e que possuem relevância toxicológica, encontramos os metais. O estudo dos efeitos dos metais no ambiente evoluiu consideravelmente nos últimos anos, revelando que estes resíduos são uma ameaça para o ecossistema aquático. Um dos metais que mais questões toxicológicas coloca é o chumbo. O chumbo é um metal não essencial, que é considerado um tóxico ambientalmente persistente, e com elevada dispersão, devido à sua utilização para vários objetivos industriais e domésticos. Um desses usos refere-se aos pesos de chumbo (chumbeiras) utilizados na pesca desportiva e comercial, que são usados em milhares de toneladas anualmente, e são posteriormente perdidos e abandonados frequentemente. Esta situação é particularmente preocupante em ambientes costeiros e estuarinos, pois os pesos de chumbo representam assim uma fonte considerável de contaminação persistente por este metal nestas áreas específicas. Este trabalho teve como objetivo avaliar os efeitos agudos (96h) e crónicos (28d) do chumbo em duas espécies marinhas, a poliqueta Hediste diversicolor e o molusco Mytillus spp., ao nível dos seus comportamentos, mas também com base numa abordagem de biomarcadores, nomeadamente quantificando as atividades da desidratase do ácido δ – aminolevulínico (δ - aminolevulinic acid dehydratase, ALA-D), catalase (CAT), glutationa-Stransferases (GSTs), acetilcolinesterases (AChE), glutationa peroxidase (GPx) e determinação dos níveis da peroxidação lipídica (TBARS). As concentrações de chumbo testadas em H. diversicolor foram de 4,21; 11,68; 59,24 e 104,91 µg/L na exposição aguda, e de 2,62; 3,02; 10,12 e 49,52 µg/L na exposição crónica. As concentrações de chumbo a que indivíduos da espécie Mytillus spp foram expostos eram 41,49; 102,76; 279,97 e 502,45 µg/L na exposição aguda, e de 15,95; 38,74; 189,79 e 407,86 µg/L na exposição crónica. Indivíduos de ambas as espécies foram também expostos a chumbeiras. A exposição ao chumbo causou uma inibição da atividade da enzima ALA-D nos organismos da espécie H. diversicolor expostos cronicamente. Foi também verificado um aumento significativo na atividade da acetilcolinerase em Hediste diversicolor expostos cronicamente a chumbo, o que sugere um efeito neurotóxico do chumbo. Também a atividade da GPx total sofreu um aumento significativo em ambas as espécies expostas cronicamente a chumbo, o que sugere um cenário de stress oxidativo. A atividade das GSTs também foi induzida em organismos da espécie Mytilus spp. expostos cronicamente a chumbo. Relativamente à atividade da catalase e níveis de peroxidação lipidica, não foram verificadas diferenças significativas. Quanto aos testes comportamentais foi possível observar um aumento significativo no tempo de enterramento dos organismos de H. diversicolor cronicamente expostos aos pesos de chumbo. No final deste estudo foi possível concluir que o chumbo na sua forma dissolvida, ou libertado a partir de chumbeiras produz efeitos toxicológicos em ambas as espécies, nomeadamente stress oxidativo e alterações comportamentais. Estas alterações podem ter consequências ecológicas significativas, nomeadamente ao nível do ecossistema, em face dos efeitos tóxicos observados nas espécies analisadas uma vez que a alteração no comportamento dos organismos pode levar a desequilíbrios populacionais e alterações nas cadeias tróficas que podem ter impacto em todo o ecossistema.

Environmental pollution is one of the biggest challenges currently faced by society. Among the most common environmental contaminants, which have toxicological relevance, we find metals. The study of the effects of metals on the environment has evolved considerably in recent years, revealing that these residues are a threat to the aquatic ecosystems. One of the metals that most toxicological questions poses is lead. Lead is a non-essential metal, which is considered an environmentally persistent toxic, and with high dispersion, due to its use for various industrial and domestic purposes. One of these uses refers to the fishing sinkers used in sport and commercial fishing, which are used in thousands of tons annually, and are subsequently lost and abandoned frequently. This situation is of particular concern in coastal and estuarine environments, as lead weights thus represent a considerable source of persistent contamination by this metal in these specific areas. This work aimed to evaluate the acute (96h) and chronic (28d) effects of lead in two marine species, the polychaete Hediste diversicolor and the mollusc Mytillus spp., In terms of their behaviours, but also based on a biomarker approach, namely quantifying the activities of δ - aminolevulinic acid dehydratase (ALA-D), catalase (CAT), glutathione-S-transferases (GSTs), acetylcholinesterase (AChE), glutathione peroxidase (GPx) and determination of lipid peroxidation levels (TBARS). The concentrations of lead tested in H. diversicolor was 4,21; 11,68; 59,24 and 104,91 µg/L in acute exposure and 2,62; 3,02; 10,12 and 49,52 µg/L in chronic exposure. The concentrations of lead to which individuals of the species Mytillus spp were exposed was 41,49; 102,76; 279,97 and 502,45 µg/L in acute exposure and 15,95; 38,74; 189,79 and 407,86 µg/L in chronic exposure. Individuals of both species were also exposed to lead sinkers. Lead exposure caused an inhibition of ALA-D activity in chronically exposed H. diversicolor organisms. There was also a significant increase in acetylcholinesterase activity in H. diversicolor chronically exposed to lead, which suggests a neurotoxic effect of lead. Total GPx activity also increased significantly in both species chronically exposed to lead, which suggests a scenario of oxidative stress. GST activity was also induced in organisms of the species Mytilus spp. chronically exposed to lead. Regarding catalase activity and levels of lipid peroxidation, no significant differences were found. As for behavioral tests, it was possible to observe a significant increase in the time of burial of the organisms of H. diversicolor chronically exposed to lead weights. At the end of this study it was possible to conclude that lead in its dissolved form, or released from real lead sinkers, produces toxicological effects in both species, namely oxidative stress and behavioral changes. These changes can have significant ecological consequences, namely at the level of the ecosystem, in view of the toxic effects observed in the analyzed species since the change in the behavior of the organisms can lead to population imbalances and changes in the trophic chains that can impact the entire ecosystem.