Efeito de solventes orgânicos no coral Sarcophyton glaucum: um contributo para avaliações ecotoxicológicas

Abstract

Um dos problemas encontrados quando se realizam testes ecotoxicológicos reside na solubilidade de compostos orgânicos lipofílicos (elevado Kow, coeficiente de partição octanol/água) que se pretende estudar (e.g., pesticidas, fármacos, compostos policíclicos aromáticos ou organoclorados). Isto implica que, para proceder à sua solubilização, se utilizem métodos físicos ou solventes orgânicos. No entanto, o uso destes últimos pode interferir per se nas respostas biológicas dos organismos de teste, o que pode afetar a fidedignidade dos resultados quanto ao efeito do composto que se está a testar. Um dos ecossistemas marinhos que tem vindo a sofrer fortes impactos derivados de alterações ambientais naturais e antropogénicas, são os recifes de coral. Neste sentido e de modo a prever efeitos de diferentes agentes químicos nos corais, tem-se vindo a explorar estes animais como organismos de teste, analisando a sua resposta a diferentes agentes agressores. Esta abordagem pretende também contribuir para a elaboração de estratégias preventivas de proteção da biodiversidade e funcionamento ecológico destes ecossistemas. Assim, no presente estudo pretende-se analisar o efeito de diferentes solventes orgânicos [etanol, metanol, dimetil sulfóxido (DMSO)] em diferentes respostas biológicas do coral mole Sarcophyton glaucum. Para tal, foram realizados ensaios de 96h onde se testaram diferentes concentrações nominais [0,01; 0,05; 0,21; 0,97; 4,48 % (v/v)] desses solventes, sendo analisados parâmetros comportamentais, respostas fotobiológicas e a densidade de zooxantelas, simbiontes associados a S. glaucum. Os resultados obtidos para os parâmetros fotobiológicos demonstraram que o etanol não provoca alterações significativas no coral até 0.21%. O metanol e DMSO, contudo, afetaram a atividade fotossintética do coral a concentrações inferiores (0,01%), sendo alguns parâmetros inibidos [ETRmax (i.e., taxa máxima de transporte de eletrões) para o metanol; α (declive inicial) e ETRmax para o DMSO]. Foi verificado ainda que a densidade de zooxantelas não sofreu uma variação linear perante o aumento das concentrações. Isto pode indicar que não ocorre disrupção simbiótica entre o hospedeiro e o simbionte. No entanto, ocorrem alterações ao nível fotobiológico dos corais e, pelo aspeto degradado de algumas réplicas, podemos referir que ocorrem alterações fisiológicas drásticas sob as concentrações mais elevadas de qualquer um dos solventes. Tendo em conta a eficiência fotossintética desta espécie quando exposta ao etanol, metanol e DMSO, constatou-se que estes solventes devem ser aplicados até um máximo de 0,97; 0,05 e 0,97% (v/v), respetivamente. Ainda assim, de um modo geral, conclui-se que a utilização do etanol é a que provoca um menor impacto nas respostas biológicas de S. glaucum, seguido do metanol e DMSO.

One of the constraints found in the ecotoxicological assessment of lipophilic (high Kow, octanol-water partition coefficient) organic compounds (e.g., pesticides, pharmaceuticals, polycyclic aromatic or organochlorine compounds) is associated with their solubility. This implies that for their solubilization, physical methods or organic solvents must be used. However, the use of solvents, in particular, can interfere with the biological responses of the test organisms, which may affect the reliability of the results in regard to effective toxicity of the compound under evaluation. One of the marine ecosystems that has been suffering strong impacts from natural and anthropogenic environmental changes, are the coral reefs. In this context, and in order to predict the effects of different chemical agents in the corals, the potential of these animals as test organisms has been recently assessed, through the analysis of their response to different stress agents. This approach also intends to contribute for the development of preventive protection strategies of the biodiversity and ecological function of coral reef ecosystems. Therefore, the goal of the present study was to analyze the effect of different organic solvents [ethanol, methanol, dimethyl sulfoxide (DMSO)] in different biological responses of the soft coral Sarcophyton glaucum. For this, it was conducted 96h-assays in which different concentrations of the solvents were tested [0.01; 0.05; 0.21; 0.97; 4.48 % (v/v)], being analyzed behavioral parameters, photobiological responses and the density of the zooxanthellae symbionts associated with S. glaucum. The results obtained for the photobiological parameters demonstrated that the ethanol did not cause significant changes up to 0.21%. However, the methanol and DMSO affected the photosynthetic activity and efficiency of the coral at lower concentrations (0.01%), being some parameters inhibited [ETRmax (maximum electron transport rate) for methanol; α (initial slope) and ETRmax for DMSO]. It was also verified that the variations of the zooxanthellae density along different solvents concentrations did not present a particular trend. This might suggest that it did not occur a symbiotic disruption between the host and the symbiont. However, some changes had occurred at the corals photobiological responses, and considering the degraded appearance of some corals, it can be inferred that drastic physiological changes occurred under the higher concentrations of each solvent. Taking into account the photosynthetic efficiency parameter of this species towards ethanol, methanol and DMSO, the maximum concentrations at which they can be applied for ecotoxicological purposes are 0.97, 0.05 and 0.97 (v/v), respectively. Even so, it was concluded that ethanol is the one that caused less impact on S. glaucum biological responses, followed by methanol and DMSO.