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Title: Caracterização sazonal de uma praia estuarina da Ria de Aveiro : estrutura da comunidade e relações tróficas de espécies seleccionadas
Author: Rodrigues, Clara Lúcia Ferreira
Advisor: Cunha , Maria Marina Pais Ribeiro da
Keywords: Zonas costeiras - Teses de mestrado
Macroinvertebrados
Bentos
Interacções tróficas
Ecossistemas estuarinos - Canal de Mira (Ria de Aveiro, Portugal)
Defense Date: 2004
Publisher: Universidade de Aveiro
Abstract: As praias, devido aos processos físicos e geológicos associados ao ambiente sedimentar, são um dos habitats mais inóspitos para o estabelecimento de comunidades de macroinvertebrados. No entanto, apesar da sua aparente uniformidade e pobreza específica, as praias sedimentares possuem uma fauna marinha de grande diversidade ecológica. A distribuição da macrofauna nestas praias depende de uma série de respostas quer físicas quer biológicas ao ambiente, sendo a zonação um fenómeno bem conhecido nos habitats intertidais. Nas condições relativamente protegidas dos sistemas estuarinos, as zonas intertidais são caracterizadas pela abundância de matéria orgânica e pela presença de cadeias tróficas complexas, onde os macroinvertebrados desempenham um papel fundamental no fluxo de matéria e energia para níveis tróficos superiores. Neste estudo é realizada a caracterização espaciotemporal da comunidade de macroinvertebrados bentónicos e dos parâmetros ambientais numa praia estuarina do Canal de Mira (Ria de Aveiro, NO Portugal), é estimada a produção secundária anual e são determinadas relações tróficas entre algumas das espécies mais importantes. A caracterização espacio-temporal foi efectuada através de uma amostragem aleatória estratificada sazonal (Abril, Julho, Outubro de 2002 e Janeiro de 2003), realizada numa área rectangular (15 × 140 m) perpendicular à linha de água. Esta área foi dividida em cinco estratos estabelecidos a priori com base em características macroscópicas do sedimento: orla supralitoral (OS), eulitoral superior (ES), eulitoral médio coberto por Zostera noltii (EM), eulitoral inferior coberto por macroalgas (EIa) e eulitoral inferior (EI). Em cada estrato, foram amostrados 5 pontos nos quais se colheu um "core" para análise da macrofauna e amostras de sedimento para determinação da concentração em clorofila a, conteúdo em água e matéria orgânica e análise granulométrica. Procedeu-se igualmente à medição in situ da temperatura, salinidade e potencial redox. Este desenho experimental permitiu testar estatisticamente a validade das zonas definidas a priori e avaliar a significância de diferenças espacio-temporais nos parâmetros ambientais e na comunidade faunística das diferentes zonas ou estratos. O tratamento estatístico dos dados ambientais incluiu análises de variância (ANOVA) factoriais e simples seguidas sempre que aplicável de testes post-hoc (testes de Tukey). Para os dados faunísticos foram utilizados métodos de análise multivariada incluindo ordenação (MDS) e análise de similaridades (ANOSIM). O programa utilizado (PRIMER) permitiu ainda relacionar parâmetros ambientais e distribuição da macrofauna através da rotina BIOENV. A ANOVA realizada aos dados ambientais revelou diferenças significativas quer para as diferentes estações do ano, quer para os vários estratos. Os resultados frequentemente inconclusivos do teste de Tukey e a formação de grupos dependentes da estação do ano e do parâmetro ambiental considerado sugerem a existência de um gradiente ambiental, no lugar de uma divisão rígida entre os estratos superiores e inferiores. Deste modo o local de estudo pode ser descrito como uma praia de tipo morfodinâmico intermédio, com uma zona superior reflectiva, controlada por factores físicos e uma zona inferior claramente dissipativa controlada por factores químicos. A zona superior é dominada pela elevada taxa de circulação de água no sedimento e reduzida retenção de matéria orgânica, enquanto que a zona inferior é caracterizada pela elevada retenção de matéria orgânica, reduzida circulação de água através do sedimento e consequentes condições redutoras mesmo perto da superfície. No conjunto das quatro amostragens sazonais foram colhidos 38087 organismos correspondentes a 54 taxa. Foi visível uma variação na riqueza específica, densidade e biomassa ao longo dos quatro períodos de amostragem. A densidade média mais elevada foi observada na Primavera e o maior número de espécies no Verão. O índice de diversidade mais elevado foi observado no Outono e no Inverno, o aumento da intensidade das condições hidrodinâmicas e ocorrência de condições de salinidade e temperatura desfavoráveis à maioria dos organismos estuarinos conduziu a um acentuado decréscimo da densidade média e do número de espécies. De uma maneira geral, em todas as estações do ano, a riqueza específica, a abundância e a biomassa aumentaram em direcção à linha de água. O MDS realizado aos dados faunísticos mostrou uma segregação clara das amostras, excepto para a zona inferior sem algas durante o Inverno. Os resultados da análise multivariada confirmaram a existência de cinco zonas significativamente diferentes e sustentam a hipótese de que é possível definir zonação em praias sedimentares com base nas características macroscópicas do sedimento. Os parâmetros ambientais que apresentaram uma melhor correlação com os dados faunísticos foram o potencial redox a 5 cm de profundidade e o conteúdo em água. A espécie dominante foi o gastrópode Hydrobia ulvae, tendo sido possível verificar a ocorrência de espécies típicas em cada estrato. Foi possível estabelecer um paralelismo entre as zonas observadas nesta área e as zonas descritas no modelo de zonação geralmente aceite para as praias arenosas: (1) uma orla supralitoral dominada por crustáceos adaptados à vida terrestre, correspondendo a OS (zona de areia seca) à qual podem ser associados o anfípode Talorchestia deshayesii e o isópode Tylos europaeus; (2) uma zona litoral caracterizada pela ocorrência de espécies verdadeiramente intertidais, em particular isópodes cirolanídeos e poliquetas spionídeos correspondendo a ES (zona de retenção) e caracterizada pela presença do isópode Eurydice pulchra e (3) uma zona sublitoral tipificada por uma variedade de espécies (sobretudo poliquetas) correspondendo a EM, EIa e EI caracterizadas pela ocorrência de uma comunidade base constituída por Nereis diversicolor, Scrobicularia plana, Cyathura carinata, Capitella sp., Streblospio shrubsolii, Polydora ligni e Tharyx marioni. Destas, EI e EIa (zona de saturação) ao apresentarem espécies típicas (anfípodes Melita palmata e Ampithoe valida e ascídia Molgula manhattensis para EIa e os poliquetas Eteone picta, Prionospio aluta, Pseudopolydora paucibranchiata e o bivalve Solen marginatus para EI) podem ser consideradas sub-zonas válidas. EM corresponde à zona de ressurgência mas não apresenta qualquer espécie típica e apenas pode ser considerada como uma sub-zona de transição entre os estratos superiores e inferiores. A produção secundária anual da comunidade em estudo foi estimada em 1128.40 gPS.m-2.ano-1. Os estratos inferiores foram mais produtivos devido à elevada biomassa de S. plana e N. diversicolor, enquanto os estratos superiores apresentaram valores de rácio P/B mais elevados devido a contribuição de espécies de pequenas dimensões (como T. deshayesii e H. ulvae). A análise dos resultados aos valores das taxas isotópicas δ13C para as várias fontes de carbono corrobora as preferências alimentares conhecidas das diferentes espécies e evidencia uma relativa segregação entre os dois sub-sistemas existentes na cadeia macroscópica: sub-sistema herbívoro e sub-sistema decompositor sendo este último o predominante. A análise isotópica de δ15N não permitiu definir níveis tróficos bem distintos para algumas das espécies indiciando dietas flexíveis e generalistas. Os elevados valores de taxas isotópicas de δ15N para os produtores primários é explicado pela probabilidade de entrada de nutrientes através da água de escorrência proveniente dos campos agrícolas adjacentes. Esta assinatura isotópica é evidente apenas no sub-sistema herbívoro. Os resultados do trabalho foram integrados num modelo conceptual que resume o funcionamento global da comunidade numa praia estuarina tipificada pelo local de estudo.
Owing to physical and geological processes associated to the sedimentary environment, beaches are one of the most inhospitable habitats for the settlement of macroinvertebrate communities. Nevertheless, despite their relatively uniform appearance and unconspicuos communities, sandy beaches harbour a marine fauna of great ecological diversity. The distribution of macrofauna in beaches is the result of several morphological and behavioural adaptations. Zonation is a well-know distribution pattern in intertidal areas. In protected estuarine systems, intertidal areas are characterized by a high organic matter content and by the occurrence of complex trophic chains where macroinvertebrates have an essential role in the flux of matter and energy to higher trophic levels. This study carried out in an estuarine beach in Canal de Mira (Ria de Aveiro, NW Portugal) includes i) the spatio-temporal characterization of the macroinvertebrate benthic community and environmental parameters, ii) the estimate of secondary production, iii) the assessment of trophic relationships and status of key-species. Spatio-temporal characterization was made by seasonal stratified random sampling (April, July, October 2002 and January 2003), in a rectangular area (15 × 140 m) perpendicular to waterline. This area was divided a priori in 5 strata, established according to differences in sediment macroscopic characteristics: supralittoral fringe (OS); upper eulittoral (ES); middle eulittoral covered by Zostera noltii (EM); lower eulittoral covered by macroalgae (IEa) and lower eulittoral without algae (IE). In each strata 5 replicates were taken each including one core for macrofauna analysis and sediment samples for the determination chlorophyll a, moisture and organic matter content, and for grain size analysis. This experimental design allowed to validate statistically the 5 zones defined a priori and to assess the significance of spatio-temporal differences in environmental parameters and faunal assemblages of the different strata. The statistical analysis of environmental parameters included two-way and one-way analyses of variance (ANOVA), followed, when applicable, by post-hoc tests (Tukey’s test). Multivariate analyses of faunal data were also performed and included non-metric ordination (MDS) and similarity analysis (ANOSIM). The software package used (PRIMER) also allowed to determine the correlation between environmental parameters and macrofaunal distribution (BIOENV routine). The ANOVA performed on the environmental data showed significant spatial (between strata) and temporal (between seasons) differences. The results, often inconclusive, of Tukey’s tests with the clustering of strata depending on the season and/or the environmental parameter considered suggest the existence of an environmental gradient rather than a clear separation of the different strata. The study area can be described as an intermediate morphodynamic beach type, with a reflective upper zone, physically controlled, dominated by high rates of water circulation and low retention of organic matter, and a clearly dissipative lower zone, chemically controlled with high retention of organic matter, low circulation of water and reduced sediments even near surface. A total of 38087 specimens were collected and ascribed to 54 taxa. Specific richness, density and biomass varied throughout the sampling period. The highest density was found in spring and the highest species richness in summer. The highest diversity index occurred in autumn but in winter the increase in hidrodynamism and the occurrence of unfavourable conditions of salinity and temperature lead to an sharp decrease in mean density and species number. In all seasons species richness, abundance and biomass increased downshore. The MDS performed on macrofauna data showed a clear segregation of samples, except for the lower eulittoral zones (with and without algae) in winter. The results of ANOSIM confirm the significance of the differences among the 5 defined a priori and support the hypothesis that it is possible to define zonation in sandy beaches using macroscopic characteristics of the sediment. Redox potential at 5 cm depth and moisture were the two environmental data that presented a better correlation with faunal data. Hydrobia ulvae was the overall dominant species. Typical species were found in each strata and the observed zones compared well with the classical zonation pattern usually accepted for sandy beaches: (1) one supralittoral fringe dominated by terrestrial or semi-terrestrial crustaceans corresponding to OS (zone of dry sand) characterized by the amphipod Talorchestia deshayesii and the isopod Tylos europaeus; (2) a littoral zone typified by the occurrence of cirolanid isopods and spionid polychaetes corresponding to ES (retention zone) where the isopod Eurydice pulchra was found and (3) one infralittoral zone typified by an array of species (mainly polychaetes) corresponding to EM, EIa and EI where a basic community composed by Nereis diversicolor, Scrobicularia plana, Cyathura carinata, Capitella sp., Polydora ligni, Streblospio shrubsolii and Tharyx marioni is found. From these latter strata, EI and EIa (saturation zone) showed typical species and can be considered valid sub-zones. The amphipods Melita palmata and Ampithoe valida and the ascidian Molgula manhatensis characterized EIa and the polychaetes Eteone picta, Prionospio aluta, Pseudopolydora paucibranchiata and the bivalve Solen marginatus characterized EI. EM, corresponding to the resurgence zone, does not present a typical species, and therefore can only be seen as a transition sub-zone between lower and upper strata. Secondary annual production was estimated in 1128.40 gDW.m-2.year-1. Lower strata were more productive, due to the high biomass of S. plana and N. diversicolor. On the other hand, upper strata showed a higher P/B ratio due to the dominance of small-sized species such as T.deshayesii and H. ulvae. The interpretation of δ13C isotopic rates agrees with the known carbon sources and food preferences of the different species and reveals a certain segregation between the herbivorous and decomposer sub-system of the macroscopic food chain. δ15N isotopic rates did not allowed to establish distinct trophic levels for some species probably as a response to the flexible and generalist diets of most estuarine macroinvertebrates. The high δ15N values determined for primary producers are indicative of a possible nutrient input through ground water coming from adjacent agriculture explorations. This isotopic signature is exhibited mainly by the herbivore sub-system. All the results are integrated in a conceptual model that summarizes the functioning of an estuarine beach ecosystem typified by the study area.
Description: Mestrado em Ciências das Zonas Costeiras
URI: http://hdl.handle.net/10773/4372
Appears in Collections:UA - Dissertações de mestrado
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DBio - Dissertações de mestrado

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