Avaliação de impacto territorial para operações de revitalização urbana: guia metodológico em contexto de aplicação real

Abstract

Os processos de monitorização e avaliação das políticas públicas têm vindo a assumir um papel cada vez mais importante na execução dos instrumentos de cofinanciamento da Política de Coesão. Mais do que um conjunto de princípios vertidos na legislação da avaliação dos fundos estruturais, reconhece-se o esforço contínuo para fortalecer estes processos, dotando a avaliação operacional e estratégica das intervenções de uma base empírica mais robusta. Porém, não é possível identificar um roteiro metodológico único, que seja aplicável a todas as áreas e domínios de atuação. A complexidade e especificidade de cada programa e ação requerem uma avaliação mais especializada, mobilizando bases concetuais, teorias e modelos analíticos melhor ajustados aos múltiplos objetivos das intervenções e ao tipo de informação existente e possível de recolher em cada contexto. Para avaliar e gerir o impacto das intervenções no terreno colocam-se desafios acrescidos, que resultam da dificuldade de encontrar métricas ou variáveis que operacionalizem adequadamente indicadores de desempenho dos projetos ou, muitas vezes, da ausência de indicadores de desempenho diretamente relacionados com cada projeto e a sua temática. Este estudo propõe e testa metodologias de avaliação de impacto de intervenções de requalificação urbana, cofinanciadas por programas do Portugal2020 – essencialmente os programas operacionais regionais. Para o efeito, são desenvolvidas e aplicadas duas metodologias complementares, que permitem avaliar os efeitos destas intervenções nas preferências de localização habitacional, tendo por base os mecanismos de mercado de habitação e a análise de preferências reveladas (valor de mercado) e de preferências declaradas (ranking / score de preferências por diferentes atributos urbanísticos). No primeiro caso, a metodologia assenta num modelo de avaliação de impacto contrafactual (AIC), centrado na abordagem da diferença nas diferenças, com o fim de perceber o impacto de intervenções localizadas de revitalização nos preços da habitação das áreas intervencionadas, face a áreas, similares, não intervencionadas. Esta abordagem, aplicada com fins demonstradores ao aglomerado urbano Aveiro-ílhavo,recorre a técnicas de econometria e adota um conjunto de procedimentos que permitam lidar com a natureza geográfica do fenómeno. Uma das inovações metodológicas a apontar centra-se na definição de comparáveis territoriais (unidades de controlo e de tratamento), fundamentais para uma análise contrafactual, onde se aplicaram algoritmos de propagação de rótulos, para identificação e delimitação de unidades territoriais de base, e análise de clusters, para determinação dos comparáveis territoriais. Os resultados demonstram que a evolução dos preços é influenciada pelo fato de um imóvel habitacional pertencer a uma zona de intervenção, tendo o valor destas habitações registado um aumento médio de 1,51€/m2 acima da trajetória expectável. Uma vez que o mercado de habitação pode ser entendido como um elemento redutor na avaliação de preferências da população (só uma ínfima parte da população participa no mercado em cada período de tempo), propõe-se uma proposta metodológica complementar, que procura avaliar a forma como as intervenções de revitalização urbana influenciam as estruturas de preferências dos cidadãos por diferentes ambientes urbanos. Esta proposta aplica os princípios da AIC mas operacionaliza os seus conceitos com o recurso a técnicas de inquirição combinadas com um modelo de análise multicritério. Além de incentivar uma abordagem mais participada no processo de avaliação, este racional promove a integração de uma dimensão mais subjetiva inerente às opiniões e perceções de impacto. Os resultados obtidos, ainda que assentes numa base exploratória, demonstram que os indivíduos apresentam estruturas de preferência rígidas, tendencialmente inalteráveis quando confrontadas com diferentes ambientes urbanos. Uma análise exploratória adicional aos fatores explicativos das preferências declaradas sugere que os territórios intervencionados são os menos atrativos para a localização residencial global da população inquirida e, não obstante observar-se uma clara maioria de inquiridos que consideram que intervenção melhorou o ambiente urbano, a contribuição da intervenção para a explicação da estrutura de preferências é negativa, sugerindo que o tipo concreto de intervenção realizada possa acentuar a menor atratividade destes ambientes urbanos para a localização residencial. Estes últimos resultados apontam para a necessidade de identificar e contemplar outros atributos ou dimensões na modelação e avaliação de impacto de intervenções desta natureza. Por fim, este estudo aponta para a necessidade de definir objetivos concretos dos projetos associando-lhes indicadores de resultado – aspetos que no caso de estudo adotado tiveram de ser inferidos pela equipa de investigação (assunções). As duas abordagens exploratórias, ancoradas em dados reais, permitem uma estratégia flexível de mensuração dos indicadores de resultado, identificando estratégias para responder aos desafios da avaliação contrafactual de intervenções de revitalização urbana, apresentando recomendações metodológicas e técnicas para informar futuros processos de avaliação.

The monitoring and evaluation of public policies have been assuming an increasingly important role in the implementation of the co-financing instruments of the Cohesion Policy. More than a mere collection of principles outlined in the legislation for the evaluation of structural funds, there is an ongoing effort to implement better evaluation processes. This involves facilitating operational and strategic assessments of interventions, based on more robust empirical methods. However, it is impossible to identify a single methodological roadmap applicable to all areas and domains of action. The complexity and specificity of each program and action require a more specialized evaluation, mobilizing conceptual bases, theories, and analytical models better suited to the multiple objectives of the interventions and the type of information that is available and possible to collect in each context. Assessing and managing the impact of interventions in practice presents additional challenges, resulting from the difficulty of finding metrics or variables that adequately operationalize performance indicators of the projects or, frequently, from the absence of performance indicators directly related to each project and its subejcts. This study proposes and tests methodologies for evaluating the impact of urban regeneration interventions co-financed by programs under Portugal2020 - essentially the regional operational programs. For this purpose, two complementary methods are developed and applied, allowing the evaluation of the effects of these interventions on housing location preferences based on housing market mechanisms and the analysis of revealed preferences (market value) and stated preferences (ranking/score of preferences for different urban attributes). In the first case, the methodology is based on a counterfactual impact evaluation model (AIC), focused on the difference-in-differences approach, to understand the impact of localized revitalization interventions on housing prices in the surrounding areas, compared to similar nonintervened areas. This approach, applied demonstratively to the Aveiro-ílhavo urban cluster, uses econometric techniques and adopts a set of procedures that deal with the geographical nature of the phenomenon. One of the methodological innovations is the definition of territorial comparables (control and treatment units), which are essential for a counterfactual analysis. And which involved label propagation algorithms, for identifying and delimitating territorial base units, and cluster analysis, for determining territorial comparables. The results demonstrate that the price evolution is influenced by the fact that a residential property belongs to an intervention zone, with the value of these properties experiencing an average increase of €1.51/m2 above the expected trajectory. Since the housing market can be understood as a limiting factor in the evaluation of population preferences (only a tiny portion of the population participates in the market in each period), a complementary methodological proposal is put forward, which seeks to evaluate how urban regeneration interventions influence citizens' preference structures for different urban environments. This proposal applies the principles of AIC but operationalizes its concepts using inquiry techniques combined with multicriteria analysis. In addition to promoting a more participatory approach in the evaluation process, this rationale integrates a more subjective dimension inherent to opinions and perceptions of impact. The results, albeit on an experimental basis, demonstrate that individuals have rigid preference structures, which tend to remain unchanged when confronted with different urban environments. An additional exploratory analysis of the explanatory factors of stated preferences suggests that the intervened territories are less attractive for the general residential location of the surveyed population. Despite a clear majority of respondents classifying the intervention as introducing an improvement in the urban environment, the contribution of the intervention to explaining the preference structure is negative, suggesting that the specific type of intervention carried out may accentuate the lower attractiveness of these urban environments for residential locations. These latest results point to the need to identify and consider other attributes or dimensions in the modeling and impact evaluation of interventions of this nature. Finally, this study emphasizes the need to define specific project objectives and associate them with outcome indicators - aspects that, in the adopted case study, had to be inferred by the research team (assumptions). The two exploratory approaches, grounded in real data, allow for a flexible strategy of measuring outcome indicators, identifying strategies to address the challenges of counterfactual evaluation exercises of urban regeneration interventions, and providing methodological and technical recommendations to guide future evaluation processes.